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1 Samuel 9 - Saul busca as jumentas extraviadas e vai ter com Samuel



Samuel Entende a Mensagem: Saul Será o Rei de Israel. (1 Samuel 9.1-17)

Ainda que os acontecimentos deste texto sejam para o benefício de Saul e de todo Israel, seu benefício primário é para Samuel. Afinal de contas, por instrução de Deus, Samuel prometeu um rei a Israel, e agora ele deve compreender exatamente quem pode ser esse rei. Os acontecimentos de nosso texto levam Saul ao contato com Samuel de um jeito que faz este profeta ter certeza de que ele é o escolhido de Deus.

Quis, o pai de Saul, é um homem de certa reputação da tribo de Benjamim. Nosso texto nos informa que ele é um homem de bens (1 Samuel 9.1). Esta expressão pode ser entendida como se referindo à coragem de um homem, seu sucesso e suas habilidades militares, ou mesmo à sua riqueza. Por uma razão ou outra, ele é um homem de renome. Saul vem de uma boa descendência. 

E ainda que Saul não tenha estabelecido sua própria reputação, ele tem todos os atributos físicos que o tornarão extremamente útil ao povo. Em resumo, ele é aquilo que nossas adolescentes chamariam de um gato. É alto (mais alto quer qualquer outro Israelita), moreno (como as pessoas daquela parte do mundo - e, uma vez que ele trabalha no campo, deveria ter um bronzeado espantoso), e lindo. No entanto, será necessário muito mais do que isto para que Saul cumpra seu chamado como rei.

E assim é que alguns animais do rebanho de Quis se perdem. Não sabemos como as jumentas se soltaram, mas, de alguma forma elas fugiram de sua fazenda. Quis manda seu filho, Saul, atrás dos animais perdidos, instruindo-o a levar consigo um dos servos para ajudar. 

Os dois partem para uma busca mal sucedida, até que as jumentas perdidas se transformam numa preocupação, mas algo que, de certa forma, acaba sendo proveitoso. Nos três dias seguintes eles cobrem uma grande área, mas não encontram as jumentas. Saul está prestes a jogar a toalha e desistir de tudo. Com toda a certeza seu pai começará a se preocupar mais com eles do que com as jumentas.

O jovem servo de Saul não tem tanta certeza. Ele sabe que chegaram muito próximo do lugar onde vive o homem de Deus. Parece que nem o servo, nem Saul conhecem este homem de Deus pelo nome, e que o servo sabe muito mais sobre ele do que Saul. Este homem de Deus é um vidente, nome antigamente usado para designar um profeta. 

O servo conhece Samuel por sua reputação, não pelo nome. Ele é um homem muito estimado, cujas palavras se cumprem - um verdadeiro profeta. Talvez possam lhe perguntar sobre sua jornada e descobrir o paradeiro das jumentas.

Saul parece gostar da idéia, mas levanta um problema muito prático - eles não têm nada para oferecer ao vidente. Suas reservas estão completamente vazias. Eles consumiram todos os seus suprimentos e sequer têm pão para comer. Como podem solicitar seus serviços sem nada lhe oferecer em troca? O servo também tem solução para este problema. 

Ele tem uma moeda que prata que será suficiente. Com este incentivo, Saul consente em pedir ajuda ao homem de Deus, ao que parece, completamente esquecido de quem ele é ou a que isto pode levar.

Quando Saul e o servo alcançam as imediações da cidade, encontram algumas jovens indo buscar água, e indagam se o vidente está lá. Elas dizem que o homem realmente está lá e que, se eles se apressarem, podem pegá-lo enquanto ainda está disponível. 

Ele está para abençoar o sacrifício e então celebrar a refeição com alguns convidados. Logo que tudo comece, Saul e seu servo terão que esperar algum tempo, uma vez que não são convidados e não ousariam interromper o sacrifício e a celebração. Este é o momento certo, mas precisam se apressar.

Saul e seu servo continuam subindo em direção à cidade. Quando se aproximam, Samuel os vê chegando. É neste ponto que encontramos outro parêntese, descrito nos versos 15 e 16. Do ponto de vista meramente humano, a chegada de Saul é improvável (eles vagueavam por lá, mal sucedidos em encontrar os animais perdidos, e agora estão sem comida e ansiosos por voltar prá casa). Do ponto de vista das jovens, eles estavam com sorte. Do ponto de vista divino eles eram esperados, como veremos a seguir. 

Um dia antes Deus falou com Samuel, indicando que ele encontraria o novo rei no dia seguinte. Será alguém da tribo de Benjamim e deve ser ungido por Samuel. Este rei é um gracioso presente de um Deus misericordioso, que ouviu o clamor de Seu povo e está levantando este homem para livrar Israel das mãos dos filisteus. 

Quando Samuel levanta os olhos e vê Saul e seu servo chegando à cidade, Deus lhe diz que este é o homem. Dessa forma Samuel sabe que aquele que vem em sua direção é o escolhido de Deus como rei de Israel.

 

Saul é Informado e Transformado (1 Samuel 9.17 à 27 - 1 Samuel 10.1 à 9)


Enquanto Samuel sabe que Saul é o escolhido de Deus como rei de Israel, Saul não tem este conhecimento. A próxima seção é amplamente dedicada ao processo usado por Deus para informar e transformar Saul como novo rei. Fica evidente pelo nosso texto que Saul não conhece Samuel. Quando chega à entrada da cidade, Saul se volta para a primeira pessoa que vê e pergunta o caminho para a casa do vidente. Samuel é aquele a quem Saul faz a pergunta. Ele o informa que é o vidente. 

Antes mesmo de Saul poder deixar escapar sua pergunta, Samuel lhe diz palavras que ele nunca pensou que ouviria. Samuel o instrui a subir à sua frente ao alto, onde o sacrifício e a refeição cerimonial estão prestes a serem realizados. Saul deve comer com Samuel nesse dia, e depois passar a noite. Na manhã seguinte Samuel lhe dirá tudo quanto está no seu coração e depois o despedirá. 

Tendo dito isto, Samuel prossegue dizendo algo que deve deixar Saul espantado: Quanto às jumentas que há três dias se te perderam, não se preocupe o teu coração com elas, porque já se encontraram. E para quem está reservado tudo o que é precioso em Israel? Não é para ti e para toda a casa de teu pai? (1 Samuel 9.20)

Saul nem mesmo tem que fazer a pergunta, pois Samuel já sabe o que ele quer saber. Sem Saul nem mesmo perguntar, Samuel lhe diz o que está faltando, há quanto tempo estão procurando, e o que foi encontrado. Se isto surpreende Saul, mais surpresas ainda estão por vir. Samuel disse a Saul que lhe contaria tudo quanto estava em seu coração... no dia seguinte (verso 19). Se esta questão das jumentas perdidas não é o que está em seu coração, então, o que é?

Creio que são as coisas ditas a seguir por Samuel a Saul, no verso 20: E para quem está reservado tudo o que é precioso em Israel? Não é para ti e para toda a casa de teu pai? As palavras que Saul diz em resposta a Samuel, registradas no verso 21, são a essência daquilo que Saul terá em seu coração a partir de agora, uma vez que a questão das jumentas já foi resolvida. 

O que significam as palavras de Samuel? E por que Samuel as diz a Saul? Como pode ser isto, se ele nem mesmo é de uma tribo ou família importante? Creio que isto seja o que Samuel coloca na cabeça de Saul, e que ele explicará mais detalhadamente na manhã seguinte. E assim será.

Samuel, Saul e seu servo seguem seu caminho para o alto, onde Samuel lhes dá o lugar de honra à cabeceira da mesa dos convidados. Samuel é um homem de fé. Quando Deus o informa que o rei virá no dia seguinte (1 Samuel 9.16), ele deixa reservado para Saul o lugar do convidado de honra na refeição cerimonial (1 Samuel 9.23-24). 

Ele separou uma porção escolhida, dizendo ao cozinheiro para servi-la quando instruído a fazê-lo (tão logo surgisse o rei prometido). Quando Saul e seu servo se assentam, Samuel instrui o cozinheiro a trazer a porção que estava reservada, à espera de sua chegada. O homem que parece ser um visitante inesperado é, na realidade, esperado, e nenhum outro senão o convidado de honra.

Há mais uma conversa entre Samuel e Saul sobre o eirado antes que Saul se prepare para a noite. Logo cedo na manhã seguinte, Samuel desperta Saul para despachá-lo em particular antes que o povo esteja circulando e observando com grande curiosidade e interesse. 

Quando eles estão deixando a cidade, Samuel instrui Saul a enviar seu servo adiante para que possa lhe falar em particular. Quando ele faz isto, Samuel toma seu vaso de azeite e unge sua cabeça, beijando-o, e informando que Deus de fato o escolheu para governar sobre todo Israel.

Sem dúvida, esta é uma bomba para Saul. Pelos acontecimentos dos dias anteriores e pelas misteriosas afirmações que Samuel lhe fez, era evidente que ele só poderia estar falando de Saul como o futuro rei. Mas agora não há lugar para mal-entendidos. As palavras e as ações de Samuel (a unção) deixam muito claro que Saul foi designado e ungido para ser o rei. 

Mas Saul é um homem que precisa de algum convencimento (1 Samuel 10.22). Então Samuel profetiza a respeito dos acontecimentos que ocorrerão nas próximas horas. Primeiro, na estrada para o túmulo de Raquel, eles encontrarão dois homens que os informarão sobre aquilo que Samuel já lhes dissera, ou seja, que as jumentas perdidas foram encontradas, e que o pai de Saul estava agora preocupado com seu filho.

Mais adiante, quando alcançarem o carvalho de Tabor, irão encontrar três homens subindo para adorar a Deus em Betel. Um dos homens terá três cabritos, o outro três pedaços de pão, e o terceiro um odre de vinho. Estes três não somente saudarão a Saul e seu servo, eles lhes darão dois pedaços de pão, que eles devem pegar. Este pão servirá como mantimento pelo restante do caminho pra casa.

Os versos 14 a 16 do capítulo 10 são parte da confirmação particular de Deus a Saul de sua escolha como rei de Israel. O escritor descreve os acontecimentos seguintes ao encontro de Saul com Samuel em ordem cronológica; assim, a chegada de Saul em sua casa, e seu diálogo com o tio, vêm depois dele se tornar profeta por algum tempo (versos 10-13). Mas, para seguir com o argumento, a conversa com o tio é parte da confirmação particular de Saul.

Quando Saul chega em casa, seu tio lá está para saudá-lo e questioná-lo sobre o que ele fez nos últimos dias. Saul dá apenas um resumo dos fatos, para que a questão da sua unção não seja levantada ou discutida. Talvez o silêncio de Saul tenha apenas estimulado seu tio, pois, certamente ele está interessado no que aconteceu, especialmente por saber que Saul se encontrou com Samuel. 

Saul está disposto a lhe dizer somente a parte referente às jumentas; assim, terá que ser Samuel aquele que apresentará publicamente Saul como rei de Israel, o que acontece na próxima seção.

 

O Rei é Apresentado a Israel (1 Samuel 10.10 à 27 - 1 Samuel 11. 1 à 13)


Finalmente Saul e seu servo alcançam o monte de Deus, onde a tropa dos filisteus está acampada, e onde ocorre o terceiro sinal. O terceiro sinal é diferente dos dois primeiros em pelo menos duas coisas. Primeiro, é testemunhado publicamente e, pelo menos parcialmente compreendido como algo importante. 

Já fomos informados sobre a profecia que Samuel deu a Saul a respeito dos dois homens que ele encontraria e depois dos três homens a caminho de Betel, mas não temos um relato completo de como estas coisas ocorrem. 

Apenas temos a informação geral de que todos esses sinais se deram naquele mesmo dia (1 Samuel 10.9). Mas, quando chega a terceira profecia - aquela que fala sobre o Espírito vindo sobre Saul - temos um relato que inclui o impacto que isto tem sobre a nação. 

Os dois primeiros sinais são quase inteiramente para o benefício exclusivo de Saul. Somente a ele foi dito que estas coisas aconteceriam. Qualquer um que presenciasse o cumprimento destas duas profecias não entenderia que são sinais, pois ignoraria sua predição detalhada. Mas este terceiro sinal é algo que chama a atenção do povo, tanto que se transforma em provérbio.

Segundo
, o que acontece a Saul no monte de Deus não é normal, é sobrenatural. O Espírito de Deus desce sobre ele e ele profetiza, junto com aqueles que são conhecidos como profetas. Não há dúvida por parte daqueles que testemunham este acontecimento surpreendente - Saul está entre os profetas. Então, por que isto é importante? É importante porque é uma demonstração pública de que Deus capacitou Saul para julgar a nação. 

Em Êxodo 18, Jetro, o sogro de Moisés, o aconselha a distribuir o peso do trabalho de julgar a nação. A indicação daqueles 70 juízes é descrita em Números 11, onde todos os 70 profetizam diante dos olhos da nação, demonstrando que o Espírito de Deus está sobre eles, capacitando-os a servirem como juízes. A mesma coisa está acontecendo agora com Saul.

 O Espírito de Deus veio sobre ele, capacitando-o a julgar a nação como seu rei. Este acontecimento é claramente sobrenatural, e é público. De fato, a mudança de Saul se torna proverbial, para que mesmo aqueles que não testemunhem este sinal possam ouvir falar sobre ele. Esta é a primeira indicação pública de que Saul deve ser o rei de Israel.

A próxima indicação será muito mais notória. Samuel convoca todo o Israel a Mispa (o lugar onde se arrependeram e se voltaram para Deus no início do ministério de Samuel - ver capítulo 7), onde ele se defronta com uma audiência muito ansiosa. Em todo o seu entusiasmo e otimismo pelo que está por vir, Samuel uma vez mais relembra aos Israelitas que sua exigência por um rei é uma manifestação de desobediência e incredulidade. 

Samuel indica que isto foi (no capítulo 8), e ainda é neste mesmo dia, uma rejeição a Deus. Este Deus, que eles trocaram por um rei humano, é o Único que os livra de todas as suas dificuldades. Não é o seu novo rei quem os livrará delas, pois foi Deus quem sempre os livrou, e quem continuará a livrá-los. A despeito do pecado de Israel, Deus está prestes a lhes dar graciosamente o rei que estão exigindo.

O rei, como visto em Deuteronômio 17.15, deve ser um homem da escolha de Deus, e esta escolha será indicada por sorteio. A primeira restrição é para a linhagem de Benjamim e então, finalmente, para Saul, exatamente aquele que Deus já indicou previamente a Samuel, aquele que Samuel já ungiu como rei. Mas este processo é para o benefício das pessoas da nação, para que sejam convencidos de que Saul é o escolhido de Deus.

Quando Saul é indicado por sorteio, ele não pode ser encontrado em parte alguma. Ninguém parece saber dele ou de seu paradeiro. É por meio de mais uma indagação ao Senhor que Ele indica que Saul está escondido entre a bagagem. O povo corre até lá, encontra Saul e o traz a Samuel. Quando as pessoas olham para Saul, ficam muito impressionadas. 

Eis um homem que já sabemos que é muito bonito (1 Samuel 9.2), e uma vez mais é dito que ele é mais alto que qualquer outro israelita. De fato, Saul é o Golias de Israel, um gigante, e, fora isto, um homem extremamente atraente. De uma perspectiva meramente física, Saul é material de primeira.

Samuel mostra ao povo o que a escolha extremamente agradável de Deus faz. Deus não faz e não dá nenhuma tranqueira. Saul é um magnífico espécimen humano. Ninguém poderia ter pedido melhor. E assim o povo começar a gritar: Viva o rei!’ (verso 24 do capítulo 10). Neste ponto Samuel esclarece todas as regras que fazem parte do governo real, escrevendo isto num livro que coloca diante de Deus. E então despede o povo para casa.

Da mesma forma, Saul vai para sua casa, acompanhado por um grupo de homens valentes cujos corações Deus tocou. Estes homens parecem ser algo como o serviço secreto de Saul, acompanhando-o aonde quer que vá, protegendo-o de qualquer um que possa querer prejudicá-lo. Estes valentes são mais uma evidência de que Saul, de fato, é o escolhido de Deus como rei de Israel.

No entanto, nem todo o povo entende desta forma, pois nosso texto nos informa que há um grupo - de desordeiros - que não vê Saul como seu libertador. Será que estes homens conhecem o velho Saul tão bem? Eles o desdenham por ter se escondido em meio à bagagem? Ele não é o seu tipo de líder?

 Realmente não sabemos porque eles olham Saul com desprezo, mas seu pecado mais grave é duvidar e discutir a escolha de Deus. Enquanto todos os outros trazem presentes para Saul, estes desordeiros não. Seu desdém por Saul é óbvio. Todavia, Saul prefere ficar em silêncio e não fazer nada com eles por enquanto. No entanto, eles aparecerão outra vez em nosso texto.

O que os israelitas realmente querem é um rei que os livre de seus inimigos. Eles querem um rei que vá adiante deles na guerra (1 Samuel 8.19-20). E, especificamente, eles querem um rei que lide com Naás, o rei dos amonitas (1 Samuel 12.12). A prova da realeza de Saul será conclusiva se ele puder liderá-los na guerra com sucesso. O capítulo 11 é justamente sobre tudo isto.

Naás, o rei amonita, sitiou a cidade israelita de Jabes-Gileade. O povo está prestes a desistir e pedir a Naás que declare seus termos de paz. As pessoas de Jabes-Gileade estão dispostas a lhe serem sujeitas; eles parecem realmente não ter escolha. Mas os termos de paz do rei são severos. Ele não apenas quer que a cidade israelita se renda, mas insiste em vazar o olho direito de cada um deles. Isto causará pelo menos duas coisas: 1) humilhará os israelitas; 2) os incapacitará, fazendo com que lutem com grande dificuldade. (Já tentou apontar uma arma ou mirar um arco e flecha sem o olho direito?)

O povo de Jabes pede a Naás sete dias para pedir auxílio a seus irmãos judeus. Se ninguém vier em seu socorro, eles prometem que se sujeitarão a ele. Mensageiros são enviados por todo o Israel, pedindo auxílio. Parece que nada está sendo feito, e que ninguém pretende se envolver. Mas, finalmente, a mensagem chega a Gibeá de Saul, e quando chega, o povo daquela cidade começa a chorar. Saul está vindo do campo e observa o lamento e pergunta o que aconteceu. Quando lhe dizem, fica furioso. 

Ele mata uma junta de bois (seus bois, ou de algum espectador indiferente?), parte-os em pedaços e envia os pedaços por todo o território de Israel, avisando que, qualquer um que se recuse a se reunir para a guerra, encontrará seus bois mortos da mesma forma. 

Parece que alguns estavam se desculpando em vir em auxílio de seus irmãos por não poderem se ausentar de suas fazendas naquele momento. As ações de Saul deixam claro que eles não terão nada com que trabalhar em suas fazendas se eles se recusarem a ajudar seus irmãos. Ele ameaça lhes tirar o equivalente a seus tratores.

Um grandioso montante de 300.000 soldados se reúne, 30.000 dos quais são homens de Judá. Uma mensagem é enviada ao povo de Jabes, assegurando-lhes que a ajuda está a caminho. Os homens de Jabes informam a Naás que no dia seguinte irão se entregar. Naás acha que isto significa que eles pretendem se render. 

O povo de Jabes espera que isto signifique que irão se entregar à luta. E assim, quando os irmãos israelitas atacam os amonitas no dia seguinte, eles realmente se entregam lutando, e o resultado é uma derrota devastadora dos amonitas. Como o texto indica não ficaram dois deles juntos (verso 11).

Saul vira herói num instante. Uma coisa para Saul é estar entre os profetas; ainda outra coisa é ele ser escolhido rei por sorteio. Mas, quando ele é aquele que pode reunir toda a nação e assim derrotar os amonitas, esta é toda a prova que o povo precisa ou quer. E agora, o povo pergunta, Quem são aqueles que diziam: Reinará Saul sobre nós? Deixem que sejam trazidos à frente e tratados por nós!

O momento mais admirável de Saul não é ao reunir a nação para a guerra, nem ao obter a impressionante vitória sobre os amonitas. Seu momento mais admirável é quando trata daqueles de seu próprio povo que falaram contra ele.

 Saul pode se vingar, e assim fazendo, trazer grande contentamento ao povo, assim como a si mesmo. Mas Saul se recusa a arrefecer o entusiasmo do dia com tal atitude. Foi o Senhor quem salvou a Israel (verso 13), e assim Saul não levantará a mão contra aqueles que desdenharam dele. Israel verdadeiramente tem seu rei, e alguém bom nisso.

 

Conclusão


Esta última observação provavelmente é a mais inesperada, ou seja, Saul é um bom rei. Infelizmente, antes disso eu só havia considerado Saul em retrospectiva. Não podia olhar para Saul sem primeiro pensar em Davi. E quando pensava em Saul à luz de Davi, Saul sempre ficava em segundo plano, e com boas razões. Além disso, descobri que sou culpado de ver o início de Saul como rei de Israel apenas sob a luz de seus últimos dias, dias que o colocaram sob uma luz bem obscura.

No entanto, se tomarmos este texto como ele se apresenta, precisamos olhar de modo diferente para Saul, à luz dos seguintes fatos: 1) Saul é um gracioso presente de Deus a Seu povo, a despeito de sua exigência pecaminosa em ter um rei. Deus dá Saul a Israel como seu rei por misericórdia e compaixão, pois notou as calamidades e o sofrimento da nação, e mandou Saul livrar o povo, da mesma forma que fez desde o êxodo (1 Samuel 9.16; 1 Samuel 10.18). 

2) Saul não é dado a Israel porque Deus quer que ele fracasse, escolhendo assim a pior espécie humana possível para dar à nação como rei. Deus escolhe um homem fisicamente superior, cuja aparência e estatura parecem se ajustar perfeitamente à tarefa que lhe está sendo dada. 

3) Deus sobrenaturalmente capacita Saul, colocando nele Seu Espírito, para habilitá-lo a julgar e a liderar com sabedoria e poder. Qualquer fraqueza que Saul tenha como homem, Deus a trata sobrenaturalmente, para que ele se torne um outro homem (1 Samuel 10.6,9). 

4) E, finalmente, Deus identifica Saul de tal forma que ninguém, exceto alguns tolos desordeiros, negam que ele seja o rei indicado.

Deus não está tentando sabotar o reinado de Saul, ainda que certamente Ele saiba que seu reinado fracassará. As falhas de Saul não são devido à sabotagem de Deus, mas ao seu fracasso pessoal em andar nos caminhos de Deus, ao seu fracasso de confiar em Deus e obedecê-Lo. Saul falha em tomar posse dos recursos que Deus graciosamente lhe deu para capacitá-lo a governar com justiça e retidão. 

Saul não é um rei de segunda classe, dado por um Deus despeitado; ele é um rei de primeira linha, completamente equipado para sua tarefa, e totalmente responsável por suas falhas. Este rei, sem dúvida, não é um Davi, mas também não é um fracassado. Para mim, este é um novo pensamento, mas um pensamento ensinado em nosso texto.

Como Deus é gracioso conosco, apesar de nosso pecado. Deus dá um rei a Israel, mas este rei não é como o rei das outras nações. Este rei é o ser humano mais magnífico disponível, um homem transformado no coração e sobrenaturalmente capacitado pelo Espírito de Deus. 

Quando Saul anda no Espírito, age como o libertador do povo de Deus. Quando anda no Espírito, reconhece que as vitórias sobre seus inimigos são vitórias de Deus, não suas. Ele é um homem marcado por humildade e graça. Isto mudará, e bem depressa. Mesmo que saibamos que esta mudança ocorrerá, vejamos quão magnífico é este rei, pelo menos por algum tempo.

A vitória militar dos israelitas liderada por Saul (capítulo 11) não é devido a Israel ter um rei, nem a qualquer mérito por parte de Israel, mas unicamente devido à graça e misericórdia de Deus, que ouve o clamor de Seu povo e uma vez mais vem para salvá-lo. Os israelitas depressa abraçam este novo rei. Ele é o tipo de rei que eles querem. Quando Jesus vem como Rei de Israel, Ele não é nenhum Saul. Não tem uma aparência impressionante, que atrai os homens, e não é abraçado entusiasticamente como o Filho de Deus:

Quem creu em nossa pregação? E a quem foi revelado o braço do SENHOR? Porque foi subindo como renovo perante ele e como raiz de uma terra seca; não tinha aparência nem formosura; olhamo-lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse. Era desprezado e o mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e, como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado, e dele não fizemos caso. (Isaías 53.1-3)

Finalmente, este texto é uma passagem fascinante no que se refere a conhecer a vontade de Deus. Deus revelou através do profeta Samuel que Ele daria um rei a Israel (I Samuel 8). E então, providencialmente (de forma circunstancial) leva Saul e seu servo ao exato lugar onde está Samuel, e à festa onde Saul é um desconhecido (de nome), mas esperado, convidado de honra. 

Deus revela diretamente a Samuel que o rei chegará no dia seguinte. Quando Samuel vê Saul pela primeira vez, Deus lhe diz que este é o convidado prometido, que deve ser o rei de Israel. E então, por meio de sinais sobrenaturais, por sorteio, e por uma vitória militar espetacular, Ele indica a Saul e a toda a nação de Israel que este homem deve ser seu rei.

Não vemos Saul buscando o reinado, nem mesmo buscando a Deus em oração. Ele está disposto a encontrar Samuel para pedir orientação divina a fim de encontrar suas jumentas, mas isto somente depois que seu servo dá a idéia e se oferece para pagar por isto. Saul é designado como rei de Israel quando cuida dos afazeres diários da vida. Quem pensaria que este homem começaria procurando jumentas e acabaria sendo apontado como o rei de Israel?

Parece também que Samuel obtém a orientação divina ao cuidar do curso normal de sua vida e ministério. Samuel está ministrando como sempre faz, quando Deus lhe diz que o rei chegará no dia seguinte. Samuel compreende a vontade de Deus a respeito do rei de Israel, quando desempenha fielmente seus deveres como profeta e juiz de Israel. 

Deus tem um jeito de tornar clara Sua vontade para nós, quando nos é necessário conhecê-la. Ele não tenta esconder Sua vontade, e quando é seu intento revelá-la, não podemos evitá-la. A vontade de Deus não é um segredo que precisa de uma técnica especial para ser conhecido.

Quando você se levantar amanhã de manhã, pense neste texto e no que ele implica. Que tarefa irritante estará em seu caminho? Será procurar jumentas perdidas? Provavelmente não, mas haverá algumas tarefas cotidianas e irritantes, que parecem consumir sua vida com pouco significado. Deus tem um modo de usar tais tarefas irritantes como meios para fins muito maiores.

Israel ansiosamente aguarda a chegada de seu rei. Cada ação, cada palavra de Samuel é vista com grande expectativa e interesse. Se estes antigos israelitas aguardavam tão ansiosamente seu primeiro rei, quanto mais ansiosos devemos estar pela vinda do Rei dos reis, nosso Senhor Jesus Cristo? Será que iniciamos cada dia nos perguntando se este é o dia? Estamos cuidando fielmente de nossas obrigações, ansiosos em agradar ao Rei que vem? Vamos começar cada dia com senso de ansiosa antecipação, sabendo que a vinda de nosso Rei pode ser hoje.

Seus seguidores, e mesmo Seus discípulos mais próximos, querem que Jesus seja um rei como Saul, mas Jesus se recusa. Ele não vem para acabar com o governo romano, mas para dar Sua vida em resgate de muitos. Ele vem a um mundo pecaminoso, e suporta a pena de homens vis, para que possam ter seus pecados perdoados e se tornem filhos de Deus. Este é o tipo de rei que muitos rejeitam hoje. Eles gostariam de um rei mais parecido com Saul. 

Saul é o primeiro rei de Deus, e no início é um bom rei. Mas, na verdade, há somente um único grande rei, e este é Jesus, o Rei dos judeus, que veio à terra como filho do homem (sem deixar Sua divindade), viveu uma vida sem pecado, e foi crucificado por causa do pecado dos homens, e ressurgiu da morte ao terceiro dia. Este é o mesmo Rei que irá voltar, e então, todos O reconhecerão, e todo joelho se sobrará diante Dele. Ele subjugará todos os Seus inimigos e então governará sobre a terra em perfeita justiça. Este é o Rei pelo qual esperamos.
                                                             
                                                            Que Deus te abençoe!

1 Samuel 8 - Os israelitas pedem um rei e Deus concede-o




Introdução:

Ao ler o capítulo 8 de I Samuel, lembro-me de uma divertida série de acontecimentos na vida de Jacó, descrita em Gênesis 30 e 31. Jacó foge para Padã-Harã, em parte para procurar uma esposa entre seus parentes, e em parte para fugir da raiva de seu irmão, Esaú. 

Ele não tem dinheiro para pagar o dote por uma esposa, por isso, acaba trabalhando para Labão, seu sogro, durante 14 anos, em pagamento do dote de suas duas esposas, Lia e Raquel. Depois de cumprir 14 anos de serviço, eles negociam um novo “acordo”, estipulando um salário pelos próximos serviços de Jacó. Eles combinam que este salário será composto de todas as cabras listradas, malhadas e salpicadas, e de todos os cordeiros negros. O acordo terá início com um rebanho de tais animais retirado do gado de Labão.

Jacó não se contenta com os poucos exemplares que nascerão dessas cabras ou cordeiros; assim, ele inicia uma manobra que tornará suas chances mais favoráveis. O processo todo se baseia na premissa de que a cor dos descendentes do rebanho de Labão possa ser influenciada pelo ambiente onde forem concebidos e criados. Assim, ele se ocupa descascando varas. Removendo a casca em linhas abertas, a brancura das varas é exposta. As varas descascadas são depois colocadas nos lugares onde os rebanhos pastam, bebem e procriam.

Parece realmente funcionar! Os rebanhos de Jacó estão crescendo, enquanto os de Labão não. Jacó trabalha cada vez mais em seu projeto, sempre com sucesso. Ele parece sinceramente crer que Deus esteja abençoando seus esforços “de descascar varas”. Labão e seus filhos percebem, e não gostam nada disso. Jacó ouve os comentários e vê a raiva dos filhos de Labão. 

Deus lhe diz para deixar Padã-Harã e voltar à terra de seus pais. Ao tentar convencer suas esposas de que devem deixar o lugar, Jacó lhes conta o sonho que teve. No sonho, ele vê um rebanho de cabras na época do acasalamento e percebe que os machos são listrados, malhados e salpicados. O anjo de Deus chama sua atenção, dizendo-lhe que foi Ele quem o fez ser bem sucedido com seus rebanhos.

Fico me perguntando quanto tempo leva para isto ficar claro para Jacó. A prosperidade de seus rebanhos nada tem a ver com as varas que ele descascou e cuidadosamente colocou para que os animais concebessem e procriassem. As crias dos rebanhos de Labão são listradas, malhadas e salpicadas porque Deus fez com que os machos listrados, malhados e salpicados acasalassem. 

A prosperidade de Jacó não é fruto de suas mãos; na verdade, todo o seu descascamento de varas foi pura perda de tempo. Jacó prospera porque Deus o faz prosperar, e Ele o faz induzindo os machos listrados, malhados e salpicados a acasalar mais do que os outros.

Não é de admirar que Deus mude o nome de Jacó para Israel. Este homem, Jacó, está prestes a se tornar um dos pais da nação de Israel. Mais do que isto, Israel, xará de Jacó, demonstrará ser exatamente como seu antepassado. Eles também tentarão experimentar diversas formas de “descascamento de varas”, na tentativa de manipular as bênçãos de Deus e ser bem sucedidos.

Nos primeiros capítulos de I Samuel, os israelitas acham que podem empregar a Arca de Deus como “descascador de varas”. Depois de serem derrotados pelos filisteus, eles tomam a Arca e a levam junto com eles para a batalha, certos de que ela lhes dará a vitória. Como sabemos isto não acontece. 

Agora, no capítulo 8, não é na Arca, mas num rei que os israelitas depositarão sua confiança e esperança. Seu desejo por um rei nada mais é do que outro capítulo de uma longa história de “descascamento de varas”. Vamos prestar atenção às mudanças importantes que este capítulo traz à história de Israel, ansiosos para entender as lições que eles demoraram tanto para aprender.

Observações Importantes:

Antes de iniciarmos nossa exposição de I Samuel 8, algumas observações muito importantes devem ser feitas, tendo em vista que afetam consideravelmente a maneira de entendermos e aplicarmos nosso texto.

Primeiro, Deus Se faz rei de Israel no Êxodo. Quando Deus liberta os israelitas do cativeiro egípcio e lhes dá a Sua lei, Ele estabelece a Si mesmo como rei de Israel. A disputa com faraó, na realidade, é entre um Rei e outro. Só depois de atravessarem o Mar Vermelho é que os israelitas percebem o fato, expressando-o num hino de louvor:

“Sobre eles cai espanto e pavor; pela grandeza do teu braço, emudecem como pedra; até que passe o teu povo, ó SENHOR, até que passe o povo que adquiriste. Tu o introduzirás e o plantarás no monte da tua herança, no lugar que aparelhaste, ó SENHOR, para a tua habitação, no santuário, ó Senhor, que as tuas mãos estabeleceram. O SENHOR reinará por todo o sempre.” (Êxodo 15.16-18, ênfase minha)

Deus é o Único que promete “ir adiante” (e depois) de Seu povo, como faria um rei (Êxodo 23.23 ''Porque o meu anjo irá adiante de ti, e te levará aos amorreus, e aos heteus, e aos perizeus, e aos cananeus, heveus e jebuseus; e eu os destruirei.'')

(Isaías 45.2 ''Eu irei adiante de ti, e endireitarei os caminhos tortuosos; quebrarei as portas de bronze, e despedaçarei os ferrolhos de ferro.'')

(Isaías 52.12 ''Porque vós não saireis apressadamente, nem ireis fugindo; porque o SENHOR irá diante de vós, e o Deus de Israel será a vossa retaguarda.'')

Estudiosos do Velho Testamento observaram que a outorga da Lei, firmando o pacto entre Deus e Israel de Êxodo a Deuteronômio, segue a mesma forma dos tratados ou pactos feitos entre os reis daquela época e seus súditos. O povo daquele tempo reconheceria imediatamente a implicação - que Deus estava firmando as bases da aliança para o Seu governo como rei de Israel. Isto é claramente indicado em outros lugares.

“Esta é a bênção que Moisés, homem de Deus, deu aos filhos de Israel, antes da sua morte. Disse, pois: O SENHOR veio do Sinai e lhes alvoreceu de Seir, resplandeceu desde o monte Parã; e veio das miríades de santos; à sua direita, havia para eles o fogo da lei. Na verdade, amas os povos; todos os teus santos estão na tua mão; eles se colocam a teus pés e aprendem das tuas palavras. Moisés nos prescreveu a lei por herança da congregação de Jacó. E o SENHOR se tornou rei ao seu povo amado, quando se congregaram os cabeças do povo com as tribos de Israel.” (Deuteronômio 33.1-5, ênfase minha; Êxodo 19.3-6; Levítico 20.26; Levítico25.23)

No Salmo 74, Asafe considera os feitos de Deus durante o êxodo como evidências de que Ele é o Rei de Israel:

“Ora, Deus, meu Rei, é desde a antiguidade; ele é quem opera feitos salvadores no meio da terra. Tu, com o teu poder, dividiste o mar; esmagaste sobre as águas a cabeça dos monstros marinhos. Tu espedaçaste as cabeças do crocodilo e o deste por alimento às alimárias do deserto. Tu abriste fontes e ribeiros; secaste rios caudalosos.” (Salmos 74.12-15).

Segundo, depois de libertar os israelitas do cativeiro egípcio, Deus os prepara para o fato de que terão um rei. Em Gênesis 49.8-12, fica claro que um descendente de Judá governará sobre Israel. Na profecia de Balaão em Números 24.15-19, uma predição semelhante fala de um dos descendentes de Jacó governando e derrotando os inimigos do povo de Deus. 

Em Deuteronômio 17.14-20 Deus indica que haverá uma época em que Israel pedirá um rei. Mais tarde, mais coisas serão ditas a respeito desta profecia, no entanto, deve ser salientado que aqui, em I Samuel 8, é seu cumprimento literal.

Terceiro, esta é a primeira das três vezes em I Samuel que Deus fala aos israelitas por meio de Samuel sobre o perigo de exigirem um rei (ver também 1 Samuel 10.17-19; 1 Samuel 12.6-18). O capítulo 8 é a primeira narrativa da exigência de um rei feita por Israel, das respostas de Samuel e de Deus, e da advertência de Samuel ao povo. 

Contudo, vamos nos lembrar de que este assunto será retomado nos capítulos 10 e 12. Para entendermos I Samuel 8, precisamos estudá-lo à luz dos capítulos 10 e 12.

Quarto, a ênfase do capítulo 8 não está no perigo da rejeição de Israel a Deus e sua idolatria (embora isto seja mostrado); a ênfase recai sobre os altos custos de um rei (1 Samuel 8.10-18). O “princípio da proporcionalidade” é sempre uma dica importante para o significado e interpretação de um texto. Em nosso capítulo, sabemos que a exigência de Israel por um rei é idolatria, idolatria do mesmo tipo que Israel vem praticando desde o (Êxodo 8.7-9). 

Sabemos que quando Samuel fala ao povo, ele lhes diz “todas as palavras de Deus” (1 Samuel 8.10), mas o que está escrito e preservado para nós é o conteúdo dos versos 10-18, que é uma descrição detalhada dos custos de um reino. O custo de um reino é a ênfase das palavras de Samuel neste capítulo.

Quinto, a exigência por um rei não vem apenas dos anciãos de Israel (verso 4), mas de todo o povo (1 Samuel 8.7, 10, 19, 21-22). À primeira vista, parece que apenas os anciãos estejam exigindo um rei. À medida que o capítulo se desenrola, fica bem claro que todo o povo de Israel está por trás do movimento. Para mim, isto indica que Israel está funcionando mais ou menos como uma democracia. Seus anciãos são mais representantes do que líderes do povo.

Sexto, repare que, conforme passamos do capítulo 7 para o capítulo 8, passamos do início do “governo” de Samuel como juiz no capítulo 7 para um aparente “final” de seu governo no capítulo 8. Grande parte de seu ministério é ignorada em I Samuel. Talvez seja porque o autor quer que vejamos mais claramente o contraste entre a maneira como seu “governo” começou e a maneira como o povo quer que termine. Samuel, na verdade, é o último de uma geração em extinção - os juízes. No entanto, vamos relembrar o que o autor do livro de Juízes diz no início de sua obra:

“Suscitou o SENHOR juízes, que os livraram da mão dos que os pilharam. Contudo, não obedeceram aos seus juízes; antes, se prostituíram após outros deuses e os adoraram. Depressa se desviaram do caminho por onde andaram seus pais na obediência dos mandamentos do SENHOR; e não fizeram como eles. Quando o SENHOR lhes suscitava juízes, o SENHOR era com o juiz e os livrava da mão dos seus inimigos, todos os dias daquele juiz; porquanto o SENHOR se compadecia deles ante os seus gemidos, por causa dos que os apertavam e oprimiam. Sucedia, porém, que, falecendo o juiz, reincidiam e se tornavam piores do que seus pais, seguindo após outros deuses, servindo-os e adorando-os eles; nada deixavam das suas obras, nem da obstinação dos seus caminhos.” (Juízes 2.16-19, ênfase minha)

O que me fascina é que “nos bons tempos” dos juízes, o povo de Deus seguia o Senhor durante toda a vida do juiz. Só depois que o juiz morresse é que Israel se afastava de Deus e se corrompia. Mas no caso de Samuel, ele ainda não está morto. Simplesmente está velho e parcialmente aposentado. E eles já estão ansiosos para se verem livres dele. É impressionante.

Sétimo, de forma alguma nosso texto sugere que Samuel seja outro Eli, um líder fraco e patético. Em toda a história de Israel não houve nenhum juiz mais importante do que Samuel. Com frequência, ele fala da parte de Deus ao povo. Não há registro de nenhuma profecia de Eli. 

Na verdade, ele recebe suas revelações em segunda-mão (1 Samuel 2.27-36; 1 Samuel 3.1-18). Samuel é um grande homem de oração (1 Samuel 7.5; 1 Samuel 8.6 e 21; 1 Samuel 15.11). Não lemos orações de Eli. Samuel é um líder decisivo, que age quando Saul não o faz (1 Samuel 15.32-33). 

Eli não poderia ser chamado de decisivo, e alguns talvez nem mesmo o chamem de líder. Samuel é de grande valia na derrota militar dos filisteus (1 Samuel 7.13), mas Eli é associado a um período de derrota militar (compare 1 Samuel 4.9 e 1 Samuel 7.13-14). 

Samuel é um homem de grande integridade pessoal (1 Samuel 12.1-5), enquanto o mesmo não pode ser dito de Eli, que parece ter engordado com a carne mal adquirida de seus filhos (1 Samuel 2.29). A morte de Samuel é ocasião de luto nacional (1 Samuel 25.1; 1 Samuel 28.3), mas não é assim com a morte de Eli (1 Samuel 4.12-22). Vamos deixar que as próprias Escrituras façam um resumo da vida de Samuel:

“Nunca, pois, se celebrou tal Páscoa em Israel, desde os dias do profeta Samuel; e nenhum dos reis de Israel celebrou tal Páscoa, como a que celebrou Josias com os sacerdotes e levitas, e todo o Judá e Israel, que se acharam ali, e os habitantes de Jerusalém.” (II Crônicos 35.18)

“Moisés e Arão, entre os seus sacerdotes, e, Samuel, entre os que lhe invocam o nome, clamavam ao SENHOR, e ele os ouvia.” (Salmos 99.6)

“Disse-me, porém, o SENHOR: Ainda que Moisés e Samuel se pusessem diante de mim, meu coração não se inclinaria para este povo; lança-os de diante de mim, e saiam.” (Jeremias 15.1)

“E que mais direi? Certamente, me faltará o tempo necessário para referir o que há a respeito de Gideão, de Baraque, de Sansão, de Jefté, de Davi, de Samuel e dos profetas,” (Hebreus 11.32)

O fato puro e simples é que Samuel é o maior juiz de todos os tempos. Durante o período de seu serviço, Israel alcança um de seus “pontos espirituais mais altos”.

Oitavo, os motivos dos israelitas quererem um rei nos versos 1-4 não nos contam toda a história, que é revelada conforme os acontecimentos dos capítulos seguintes vão sendo descritos. Não é somente a idade de Samuel e a corrupção de seus filhos que fazem os israelitas exigirem um rei. 

De acordo com o capítulo 12, ficamos sabendo que a ameaça militar feita por Naás, o rei de Amom, talvez seja a razão principal para eles desejarem um rei. A Arca de Deus está fora de serviço, Samuel em breve também estará, e os israelitas querem um rei em quem possam depositar sua confiança.

Dá-nos um Rei! (1 Samuel 8.1-5)

A maior parte da vida e do ministério de Samuel é ignorada até o capítulo 8, onde o encontramos já avançado em idade, talvez ansiando por sua aposentadoria. Seus dois filhos são constituídos por ele como juízes “sobre Israel”, estabelecidos na cidade fronteira de Berseba. Não creio que Samuel tenha nomeado seus filhos como seus substitutos, nem que ele o faça. Samuel não é apenas sacerdote e juiz, ele é também profeta. 

Não temos nenhuma indicação de que Deus, por isso, tenha capacitado seus filhos; assim, como um ou ambos poderia ocupar o lugar de seu pai? Como os outros anciãos e líderes da nação, eles podem ser juízes. No entanto, a esfera de seu ministério e autoridade é limitada e, quando fica patente que eles são corruptos, a inferência talvez seja de que Samuel resolva a questão. Nada mais é dito sobre sua corrupção ou ministério. 

No capítulo 12, Samuel fala de seus filhos como estando junto ao povo (verso 2). Ele afirma não ter cometido nenhuma injustiça e não ser culpado de corrupção, um fato que o povo confirma. Como ele poderia falar deste modo se não tivesse tratado da corrupção de seus próprios filhos? Seus dois filhos não são piedosos como o pai; eles não “andam nos seus caminhos”.

No entanto, as coisas não são como parecem ou como os anciãos as apresentam. Eles parecem sugerir que Samuel esteja “praticamente morto”, que sua liderança esteja no fim. Não é bem isto que nosso texto mostra. Ele ainda tem muitos anos de ministério pela frente. Creio que podemos dizer com segurança que os anos em que Samuel conduz a nação depois do capítulo 8 sejam mais importantes do que anos anteriores (os anos que o autor preferiu não incluir nesta narrativa). 

Além do mais, a ameaça que seus filhos representam é exagerada. Seus filhos não são seus substitutos, e eles não têm um papel importante a desempenhar no futuro da nação. Não creio que os anciãos ou o povo estejam tão preocupados com os líderes que vêem diante deles quanto com os líderes desconhecidos que não podem ver. Quem irá conduzir o povo depois de Samuel? Eles querem um homem em seu lugar. Por isso, eles exigem - não pedem - um rei como o de outras nações.

De qualquer forma, a solução proposta pelos anciãos é absurda. Pense na loucura de sua lógica, que é mais ou menos esta:

“Samuel, você está ficando velho e seus filhos (que, com certeza, ficarão em seu lugar) são corruptos. Não podemos ter um futuro brilhante se nossos líderes forem corruptos. Vamos estabelecer uma ordem inteiramente nova e ter um rei, como as outras nações. Deixe que ele nos julgue. E que haja uma dinastia, a fim de que seus filhos governem em seu lugar após sua morte.”

O papel de Samuel como juiz não é uma dinastia. Deus levantou os juízes; Ele não criou uma dinastia de juízes, cujos filhos os substituam. Se os filhos de Samuel são corruptos, eles podem ser afastados, como de fato o são. No entanto, propor uma dinastia é pedir um sistema onde os filhos do rei governem em seu lugar, quer sejam ímpios ou justos. A emenda é pior do que o soneto!

Parece que os anciãos e a nação não estejam buscando uma mudança radical, mas apenas recomendando uma limpeza do sistema atual, um “ajuste” administrativo. Eles querem justiça. Querem um juiz que decida suas questões legais. Querem simplesmente um rei como juiz em vez de um juiz como Samuel. Parece bom, mas, de forma alguma, é uma simples mudança. 

Eles querem uma reforma total do sistema de justiça de Israel. Querem se livrar do sistema de juízes e ser governados e julgados da mesma maneira que as nações ao seu redor. Não querem ser uma nação distinta, separada das outras nações. Eles não estão simplesmente tentando demitir Samuel como seu juiz; estão procurando demitir Deus como seu rei. Deus deixa isto bem claro nos versos seguintes.

As Respostas de Samuel e de Deus (1 Samuel 8.6-9)

Samuel não fica nada satisfeito com a proposta dos anciãos. Embora seja verdade que eles estejam procurando substituí-lo, não creio que seu desagrado seja porque leve isto de forma pessoal e esteja na defensiva. Literalmente, o texto nos diz que isto é “mal à vista de Samuel”. Em termos bem simples, Samuel sabe que o pedido é errado e que é pecado.

Além do mais, sua resposta confirma seu caráter piedoso. Ele não explode, despejando raiva e indignação sobre os anciãos. Ele se achega a Deus em oração, como sempre faz. A resposta de Deus à oração de Samuel confirma sua avaliação da situação, com um novo ângulo. Samuel está sendo rejeitado pelo povo; há poucas dúvidas de que isto seja verdade. 

Como um homem piedoso, talvez ele se torture achando que seja devido a alguma falha de sua parte. Deus lhe diz que, no fim das contas, é Ele e não Samuel quem está sendo rejeitado. A rejeição de Deus por Israel certamente não é culpa de Deus; por que, então, Samuel deveria se torturar com sua própria rejeição? Se Samuel está sendo rejeitado pelas mesmas razões que Deus está, ele deveria, então, tomar isto como elogio.

Conforme observado anteriormente, Deus se faz Rei de Israel na época do êxodo. Agora, Deus relembra Samuel de que a rejeição atual de Israel não é algo novo, mas apenas outro episódio de uma série sucessiva que teve início no êxodo (verso 8). Esta rejeição de Deus por um rei “como o de outras nações” nada mais é do que idolatria. 

O que realmente eles querem é um rei que seja seu ”deus”, uma questão que será retomada com mais inteireza posteriormente. Após mostrar a origem do problema, Deus diz a Samuel para atender o povo e ceder à sua pressão (verso 9a.). Embora Samuel deva conceder ao povo o seu pedido, ele também deve lhes mostrar o “direito” do rei que “reinará sobre eles” (verso 9b).

O Costume (Custo) de um Rei (1 Samuel 8.10-18)

As palavras registradas nos versos 10-18 não são a soma de tudo o que Samuel diz ao povo nesta ocasião. Elas são o que autor desejou enfatizar para nós, leitores. O verso 10 indica que Samuel “falou todas as palavras do Senhor ao povo que lhe pedira um rei”. 

Samuel, portanto, diz ao povo aquilo que Deus lhe diz nos versos 7-9, e talvez ainda outras palavras ditas por Deus e que não foram registradas no texto. Mas o autor quer que nos concentremos nas palavras dos versos 10-18. Elas parecem ser a essência do texto - ou, pelo menos, uma parte significativa da mensagem de Samuel aos israelitas que exigem um rei.

Nosso Senhor tinha muitos supostos “voluntários” que se ofereciam para ser Seus seguidores. A resposta de nosso Senhor a tais pessoas era um alerta. Ele os advertia a “pensarem nas conseqüências” (ver Lucas 9.57-62; Lucas 14.15-35). 

Samuel faz a mesma coisa em nosso texto: ele recomenda aos israelitas que “pensem nas conseqüências” de ter um rei. A essência das palavras de Samuel pode ser resumida numa única frase: “Ele tomará...

Israel está exigindo um tipo de governo muito dispendioso. Samuel procura mostrar em detalhes o custo de um reino, e que é incrivelmente caro. Para que avaliemos os altos custos de se ter um rei, primeiro precisamos refrescar nossa memória quanto ao funcionamento das coisas no governo dos juízes. No livro de Juízes vemos que não há rei, nem palácio, nem exército permanente. 

Quando Israel é atacado, um exército voluntário é convocado. Este exército, em parte, é formado pelas famílias daqueles que vão à luta (ver I Samuel 17.17-22). Não há conselho “administrativo”, consultores, empregados e quadro de funcionários para dar suporte e facilitar o governo do rei. Em resumo, o sistema é informal, ad hoc, e muito barato. Com Deus como seu rei, o sistema funciona, conforme vemos no livro de Juízes e em I Samuel 7, por exemplo.

Em contraste com um sistema de “baixo orçamento” para governar a nação, o que os israelitas estão exigindo é caro demais. Ter um rei que vá adiante deles e os lidere na guerra é ter um exército permanente. Uma vez que Israel seja governado por um rei, a vida no campo jamais será a mesma. O rei empregará seus filhos no serviço militar para conduzir seus carros ou como cavaleiros, ou como infantaria. Alguns serão separados como oficiais. 

Um exército permanente também deve ter suprimentos. Os filhos dos israelitas serão usados para plantar e ceifar as colheitas e construir e manter o equipamento militar (sem mencionar todos os suprimentos não militares exigidos). Não serão somente os jovens que o rei empregará em seu serviço. As filhas dos israelitas, que antes se sentavam à mesa e serviam seus pais, agora servirão à mesa do rei. Elas serão perfumistas, cozinheiras e padeiras.

O alto custo de um rei inclui a perda dos filhos e filhas para o serviço do rei. Mas o preço é ainda maior. O rei consumirá uma enorme quantidade de alimentos, alimentos da melhor qualidade. Isto exigirá que ele tribute tudo o que é cultivado em Israel. O melhor de seus grãos irá para o rei, junto com o melhor de suas vinhas e lavouras. 

Boa parte das coisas que uma família rural israelita antes apreciava agora irá ser consumida pelos servos do rei. Os servos do rei precisam viver, e o povo também pagará por esta despesa. Um décimo de suas sementes e de suas videiras será dado aos servos do rei para plantarem em seus campos (ou na terra que o rei tomar do povo).

O rei precisará de empregados para servi-lo; portanto, tomará o que Israel tem de melhor a oferecer em matéria de servos e servas. Certamente ele precisará de gado, e jumentos para arar os campos, e tudo será suprido pelo povo. Em resumo, quando o rei for concedido ao povo, será para dominá-lo, e ele dominará. 

Esta gente que antes conhecia a liberdade, agora será escrava do rei. E quando, finalmente, perceberem o que fizeram a si mesmos, será tarde demais para mudar o curso da história. Um dia os israelitas clamarão a Deus por causa da opressão de seu próprio rei, mas Deus não ouvirá seu lamento, pois eles estão indo para o cativeiro com os olhos bem abertos.

Os Israelitas Conseguem o Que Querem (1 Samuel 8.19-22)

A nação de Israel quer um rei; Samuel os adverte de que isto lhes trará um enorme sistema político com um preço exorbitante. Mas isto não interessa. O povo está determinado a ter seu rei. O povo (não só os anciãos) se recusa a dar ouvidos a Samuel ou às suas advertências. Eles insistem em ter seu rei, mas agora são mais honestos quanto ao que esperam dele. Eles querem um rei que os governe e que vá adiante deles na guerra. Na verdade, eles querem um rei que tome suas decisões e lute por eles.

Samuel ouve tudo o que o povo diz e vai a Deus repetir todas as suas palavras (verso 21). Esta afirmação é muito interessante. Não ficamos surpresos quando lemos que Samuel diz ao povo o que o Senhor lhe disse (verso 10). 

Mas, por que Samuel sente a necessidade de dizer a Deus tudo o que o povo lhe disse? Será que Deus não ouve o que o povo está dizendo? É claro que ouve. Por que precisamos orar, se Deus já conhece todas as nossas necessidades? (ver Mateus 6.32) Não é que Deus precise nos ouvir para ser informado; é que nós precisamos de Deus. Precisamos partilhar nossos fardos com Ele. Samuel diz a Deus tudo o que o povo diz, não porque Deus precise ser informado, mas porque Samuel precisa da intimidade com Deus.

Em resposta à oração de Samuel, Deus, uma vez mais, o instrui a dar ao povo o que eles querem. Por isso, sem saber quem será este rei, Samuel despacha os israelitas para suas casas até que Deus mostre a identidade de seu novo rei (verso 22).

Conclusão

Já enfatizei bastante o mal e a tolice de Israel exigir um rei. Algumas pessoas podem querer protestar, mencionando o texto de Deuteronômio 17. Deus não disse que seria certo Israel ter um rei? Se já havia sido profetizado que os israelitas exigiriam um rei, por que Deus, então, é tão severo quando o fazem? Vamos dar uma olhada no texto de Deuteronômio 17.14-20:

“Quando entrares na terra que te dá o SENHOR, teu Deus, e a possuíres, e nela habitares, e disseres: Estabelecerei sobre mim um rei, como todas as nações que se acham em redor de mim, estabelecerás, com efeito, sobre ti como rei aquele que o SENHOR, teu Deus, escolher; homem estranho, que não seja dentre os teus irmãos, não estabelecerás sobre ti, e sim um dentre eles. Porém este não multiplicará para si cavalos, nem fará voltar o povo ao Egito, para multiplicar cavalos; pois o SENHOR vos disse: Nunca mais voltareis por este caminho. Tampouco para si multiplicará mulheres, para que o seu coração se não desvie; nem multiplicará muito para si prata ou ouro. Também, quando se assentar no trono do seu reino, escreverá para si um traslado desta lei num livro, do que está diante dos levitas sacerdotes. E o terá consigo e nele lerá todos os dias da sua vida, para que aprenda a temer o SENHOR, seu Deus, a fim de guardar todas as palavras desta lei e estes estatutos, para os cumprir. Isto fará para que o seu coração não se eleve sobre os seus irmãos e não se aparte do mandamento, nem para a direita nem para a esquerda; de sorte que prolongue os dias no seu reino, ele e seus filhos no meio de Israel.”

Este texto é uma profecia, e podemos ver que ela é rigorosamente cumprida quando os israelitas exigem um rei, exatamente como o de outras nações. O fato de alguma coisa ser profetizada não é prova de que aquilo que é predito seja bom ou justo. A traição de Judas foi predita, assim como a rejeição de Israel ao Messias. Isto não significa que Judas, ou os incrédulos israelitas, estivessem certos ao fazer o que fizeram. Significa apenas que Deus quer que conheçamos uma parte de Seu plano eterno.

Sugiro que, ainda que Deus prenuncie em Deuteronômio os acontecimentos descritos em I Samuel 8, há muito mais do que uma simples profecia ali. Se Deuteronômio 17.4 é uma profecia sobre a exigência de Israel por um rei, os outros versículos do capítulo são as instruções de Deus para evitar que este rei seja como o de outras nações. As instruções que Deus estabelece por meio de Moisés são o que torna Seu rei distinto das outras nações.

O rei deve ser israelita. Ele não deve ser escolhido por voto popular, mas divinamente designado e empossado. O rei de Deus não deve multiplicar para si cavalos ou esposas. Isto é o que os reis pagãos fazem, pois lhes dá poder político e militar. O rei de Deus não deve confiar em seus próprios recursos, em sua própria força, mas em Deus. 

Creio que seja por esta razão que a contagem das tropas israelitas por Davi seja algo tão ruim e que resulte num castigo tão severo (ver I Crônicas 21). Davi parece estar cheio de si e a contagem das tropas lhe dá sensação de poder. Por isso, Deus o trata, e ao povo, com tanta severidade. O rei não deve ter o desejo de acumular fortuna ou riquezas, pois isto também é poder. O rei deve confiar em Deus e obedecê-Lo e desafiar a nação de Israel a fazer o mesmo.

Davi é este tipo de rei quando enfrenta Golias, mas os anos de poder e prosperidade colocam sua vida à prova. Afinal, mesmo os melhores reis de Israel estão bem longe dos padrões estabelecidos por Deus em Deuteronômio 17. As falhas de Davi e Salomão nestas áreas são bastante óbvias. Enfim, só existe uma pessoa com todas estas qualificações, nosso Senhor Jesus Cristo. 

Ele foi rico, mas Se fez pobre por amor de nós. Ele não teve, nem empregou poderes terrenos para estabelecer Seu reino. Ele certamente não multiplicou poderes militares ou esposas. E é por isso que Cristo e somente Cristo pode ser o Rei de Deus, para reinar sobre a terra para todo o sempre.

“Vi e ouvi uma voz de muitos anjos ao redor do trono, dos seres viventes e dos anciãos, cujo número era de milhões de milhões e milhares de milhares, proclamando em grande voz: Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor. Então, ouvi que toda criatura que há no céu e sobre a terra, debaixo da terra e sobre o mar, e tudo o que neles há, estava dizendo: Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro, seja o louvor, e a honra, e a glória, e o domínio pelos séculos dos séculos. E os quatro seres viventes respondiam: Amém! Também os anciãos prostraram-se e adoraram.” (Apocalipse 5.11-14)

A principal lição que este texto nos ensina é aquilo que podemos chamar de “economia do pecado”. Se estou certo em minha avaliação, a ênfase principal do texto recai sobre o custo exorbitante de uma monarquia, sobretudo se comparado ao custo mínimo do governo dos juízes. 

Os israelitas estão errados em exigir um rei, pois o que eles realmente querem é substituir Deus por um ídolo humano. No entanto, deixando de lado os problemas bíblicos e morais associados à sua exigência, existe também um problema econômico muito claro. Em termos bem simples, ser governado por um rei não vale seu preço.

Os israelitas não vêem desse modo, pois estão mais do que dispostos a pagar o preço detalhado por Samuel. Creio que possa entender por que. O preço da sujeição a seus inimigos é muito alto, como vemos em Juízes 6:

“Fizeram os filhos de Israel o que era mau perante o SENHOR; por isso, o SENHOR os entregou nas mãos dos midianitas por sete anos. Prevalecendo o domínio dos midianitas sobre Israel, fizeram estes para si, por causa dos midianitas, as covas que estão nos montes, e as cavernas, e as fortificações. Porque, cada vez que Israel semeava, os midianitas e os amalequitas, como também os povos do Oriente, subiam contra ele. E contra ele se acampavam, destruindo os produtos da terra até à vizinhança de Gaza, e não deixavam em Israel sustento algum, nem ovelhas, nem bois, nem jumentos. Pois subiam com os seus gados e tendas e vinham como gafanhotos, em tanta multidão, que não se podiam contar, nem a eles nem aos seus camelos; e entravam na terra para a destruir. Assim, Israel ficou muito debilitado com a presença dos midianitas; então, os filhos de Israel clamavam ao SENHOR.” (Juízes 6.1-6)

Para os israelitas, o preço que irão pagar por seu rei é considerado bem menor do que aquele que irão pagar pela sujeição a outras nações. O que eles não entendem é que Deus os protegerá sem custo algum se simplesmente se arrependerem de seus pecados, clamarem por libertação e O servirem de todo o coração. 

Receio que este seja o preço que eles consideram alto demais. Eles não querem abandonar seus ídolos pagãos. Não querem servir somente a Deus. Não querem que Deus seja seu rei. Por isso, procuram substituir tanto a Deus, quanto a Samuel, tendo um rei como as outras nações.

Ao discutir este texto, um amigo meu observou o seguinte: “Se for pagar por um deus, 10% não é muito caro”. Ele tem razão. Se você conseguisse um ”Deus” de verdade sem pagar caro por ele, seria vantajoso. Mas o fato é que, ao pagar caro por um rei, Israel recebe muito pouco em troca. Os israelitas pensam que seu rei tomará (julgará) suas decisões por eles, dizendo-lhes o que fazer, e que lutará suas batalhas. 

Uma recapitulação de Deuteronômio 28-32 deveria relembrar aos israelitas de que não é seu rei quem lhes dá paz e prosperidade; é seu Deus. Não é seu rei que é digno de sua fé, confiança e obediência (somente); é Deus. Eles esperam que um rei faça por eles o que só Deus pode fazer, com ou sem rei. Eles estão dispostos a pagar caro por algo que não vale a pena.

O pecado também é assim, e Satanás sempre procura nos convencer a pecar de um jeito que faria um vendedor trapaceiro de carros usados chorar de inveja. Ele procura supervalorizar nossa avaliação dos benefícios do pecado, ao mesmo tempo em que se esforça para nos convencer de que o preço é irrisório. No Jardim do Éden, Satanás fez Eva acreditar que realmente podia ser como Deus, e que comer o fruto proibido não resultaria realmente na morte. 

Quando pecamos, estamos acreditando na mentira de Satanás. Achamos que podemos “usar” o pecado enquanto tivermos controle sobre ele. A realidade é que o pecado rapidamente ganha o controle sobre nós e nos tornamos seus escravos. Não importa o quanto sejamos tentados e contemplemos o caminho do pecado, vamos nos lembrar do que a Bíblia nos ensina sobre sua economia: o preço é muito caro e o percurso é muito curto. O pecado não compensa.

Por que, então, mesmo depois que Samuel adverte os israelitas sobre os custos da monarquia, eles não lhe dão ouvidos e exigem seu rei?
Por que os homens estão dispostos a pagar tanto por tão pouco?
Creio que saiba a resposta, e que ela esteja claramente implícita em nosso texto. Os homens detestam a graça. A graça é detestável e repugnante porque é caridade. A graça não massageia nosso ego; ela produz humildade. Quando pagamos por alguma coisa (com trabalho ou dinheiro), achamos que somos donos dela. Achamos que quando pagamos, estamos no controle. 

Quando recebemos a graça, não estamos no controle. Deus está no controle. A graça é concedida soberanamente, por isso, não podemos ditar como e quando ela nos será concedida por Deus; não podemos controlar seus benefícios. Mas as boas e velhas obras forçam Deus a nos abençoar (como erroneamente supomos). Quando fazemos as coisas certas, Deus deve responder da forma que esperamos. Estamos no controle. Deus se torna nosso servo. 

Por isso, os homens preferem pagar - e pagar muito - para manter seu orgulho e sensação de controle. Esta é a razão pela qual os homens preferem os ídolos a Deus, mesmo que tenham que carregá-los. Eles crêem que servir aos ídolos faz com estejam no controle do seu “deus”. Que tolice!

Acho muito interessante que os israelitas queiram um homem como seu deus. Jamais funcionará, e o preço dessa tentativa será bem alto. O jeito de Deus é fazer-Se homem, Deus-Homem, para salvar o homem de seus pecados e governar sobre a terra como Rei, o Messias Prometido. Este Rei prometido que foi anunciado para ser Deus e homem não é nenhum outro senão o Senhor Jesus Cristo.

Ainda precisamos aprender uma última lição deste texto: Às vezes Deus nos dá aquilo que queremos e até mesmo exigimos, mesmo que isto venha a ser doloroso para nós. Lembro-me de uma passagem em Salmos que fala da queixa dos israelitas por não terem carne, fazendo com que Deus os deixe de barriga cheia. É esta:
“E ele satisfez-lhes o desejo, mas fez definhar a sua alma.” (ARA)
“Deu-lhes o que pediram, mas mandou sobre eles uma doença terrível.” (NVI)

Existe uma persistência na oração e na súplica que não é evidência de fé, mas evidência de torpe ganância. Existe uma perseverança na oração que, de forma alguma, é santa. É possível que, se persistirmos em pedir aquilo que não é bom, Deus nos atenda.

Será doloroso se isto acontecer, mas ao nos dar aquilo que tanto desejamos, Deus nos disciplina para que aprendamos a deixar estas coisas em Suas mãos. Em termos bíblicos, devemos nos concentrar em buscar primeiro a Deus, e confiar Nele para que todas as coisas nos sejam acrescentadas (Mateus 6.33 ''Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.'').

Vamos ter cuidado para que nossas petições a Deus não sejam exigências. Aprendamos com os israelitas do passado para que não andemos nos caminhos que eles andaram.



                                                        Que Deus te abençoe!

O que é dele, é seu e o que é seu, é dele! #Novela Gênesis | Capítulo 61

  ( “Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne.” Gênesis 2.24). Ser uma só carne ...