O rei Davi era já velho…” Assim começa o relato do último capítulo da vida
do grande monarca de Israel (1 Reis 1.1). Prestes a despedir-se do mundo, Davi
teria que enfrentar seu último gigante.
Adonias, seu filho, apoiado por algumas das
pessoas de maior confiança de Davi, resolvera usurpar o trono do próprio pai,
embora soubesse que estava destinado a seu meio-irmão Salomão. Nada indicava que
ele fosse capaz de tal ‘proeza’. Crescera à sombra de Absalão, que se destacava
por sua beleza e ambição.
Este também conspirou contra seu pai, e acabou
assassinado pelo comandante do exército de Israel. Depois da morte de Absalão,
Davi devotou a Adonias todo o seu amor. Talvez movido de culpa pelo que
aconteceu a Absalão.
O texto bíblico diz que “seu pai jamais o havia
contrariado” (1 Reis 1.6).
Enquanto Absalão tinha um espírito independente, e fora
criado solto, Adonias fora criado nas barras de seu pai. Ambos conspiraram para
tomar o trono de Israel, porém, com motivações bem distintas. Absalão era movido
pela vaidade.
O que desejava era o poder, a fim de provar à
todos que poderia ser um rei mais competente que seu pai (2 Samuel 15.4 "Dizia mais Absalão: Ah, quem me dera ser juiz na terra, para que viesse a mim todo o homem que tivesse demanda ou questão, para que lhe fizesse justiça!" ). Já Adonias
foi movido pela paixão.
O texto diz que Davi, já de idade avançada,
“por mais que o envolvessem com cobertas, não conseguia se aquecer. Então
lhe disseram os seus servos: Busque-se para o rei meu senhor uma jovem virgem,
que esteja perante o rei, e tenha cuidado dele. Durma ela no seu seio, para que
o rei meu senhor se aqueça. Assim procuraram por todos os termos de Israel uma
jovem formosa, e acharam a Abisague, sunamita, e a trouxeram ao rei. Era a jovem
sobremaneira formosa: cuidava do rei, e o servia, porém o rei não a conheceu.
ENTÃO Adonias, filho de Hagite, se exaltou, dizendo: EU REINAREI” (1 Reis
1.1-5).
Abisague fora escolhida como a última concubina
de Davi. Aquele que o sucedesse no trono, herdaria seu harém, e isso, incluía
aquela linda jovem. Foi por desejá-la, que Adonias fez o que fez. Não era o
trono que lhe interessava, mas o prazer que teria ao possuir àquela linda virgem
que cuidava de seu velho pai.
Que desperdício! Imaginava Adonias. – Uma
jovem tão formosa, cuidando de um velho incapaz de satisfazê-la.
Enquanto Absalão fora seduzido pelo
poder, Adonias foi seduzido pela luxúria.
O coração humano é deveras complexo. Há desejos
que escondem motivações mais profundas, por vezes, inconfessáveis. Uns almejam o
trono pelo poder, outros pelo prazer. Mas poucos são os que o almejam pela
motivação certa.
Paulo diz que “se alguém aspira ao
episcopado, excelente obra deseja” (1 Timóteo 3.1).
Houve um tempo em que
muitos jovens almejavam o ministério com motivações puras. Queriam ganhar almas,
servir ao rebanho, e glorificar a Deus através de suas vidas. Hoje, porém, há
muitos que aspiram ao ministério pelo glamour, pela fama, pelo
dinheiro, pelo poder. Aliás, sempre houve quem nutrisse tais motivações.
Paulo
denuncia aqueles que imaginavam que o ministério fosse “fonte de
lucro” (1 Timóteo 6.6 "Mas é grande ganho a piedade com contentamento." ).
Pedro também os denuncia e diz que “muitos seguirão
as suas dissoluções, e por causa deles será blasfemado o caminho da verdade. Por
ganância farão de vós negócio, com palavras fingidas” (2 Pedro 2.2-3a).
Não é o trono que querem, e sim, Abisague. O
trono é apenas o meio de se alcançar o verdadeiro objetivo. Da mesma forma, não
é o ministério que aspiram, mas a fama, que eventualmente, vai possibilitá-los
concorrer a um cargo político. O nome de Deus é usado para que se consiga outros
fins. É triste constatar isso, mas é a mais pura realidade.
E quem não se dobra isso é tachado de
idiota. É como o velho Davi, que tem Abisague ao alcance das mãos, mas
é incapaz de possuí-la.
Quando Natã, o profeta, soube das intenções de
Adonias, chamou Bate-Seba em particular, e pediu que colocasse Davi à par do que
estava acontecendo. Afinal de contas, Davi jurara que Salomão, filho de
Bate-Seba, seria seu sucessor no trono.
Ao saber que Adonias estava promovendo uma
festa em que se auto-proclamava o novo rei de Israel, Davi mandou que buscassem
sua mula, e fizessem com que Salomão a montasse, e que, chegando a Giom, fosse
ungido pelo profeta Natã, e pelo sacerdote Zadoque, como o legítimo rei de
Israel.
Naquele momento, Israel tinha dois reis, um
legítimo, outro impostor. O povo, percebendo o que acontecia, deixou a festa de
Adonias, e juntou-se aos que celebravam a posse de Salomão.
Ao ser informado do que acontecia, Adonias se
desesperou, pois sabia que seria acusado de traição, o que resultaria em sua
morte. Para evitar o pior, Adonias agarrou-se às pontas do altar, pois achava
que ninguém se atreveria a matá-lo ali.
Só deixou aquele lugar, depois de
receber a garantia de que Salomão pouparia sua vida. Como Adonias, tem muita
gente agarrada às pontas do altar, não por amar a Deus ou ao ministério, mas
para protegerem seus interesses.
Depois que a poeira baixou, e o trono de
Salomão foi consolidado, Adonias resolveu fazer uma nova investida. Mas agora,
ele iria direto ao ponto. Em vez de um complô, Adonias acercou-se de Bate-Seba,
mãe do rei, e pediu que intercedesse por ele. Repare em seus argumentos:
“Bem sabes que o reino era meu, e todo o
Israel tinha posto a vista em mim para que eu viesse a reinar, ainda que o reino
se transferiu e veio a ser de meu irmão; pois foi feito seu pelo Senhor. Agora
um só pedido te faço; não mo rejeites. Ela lhe disse: Fala. Ele disse: Peço-te
que fales ao rei Salomão (pois não to recusará), que me dê por mulher a
Abisague, a sunamita” (2.15-17).
Em outras palavras: - Já que não posso ter o
trono, que eu tenha Abisague! Isso era tudo o que ele realmente
queria. Semelhantemente, há muitos que já desistiram do ministério, mas não
desistiram do que ele possa oferecer.
Alguns ostentam o título de pastor, sem ao
menos terem um rebanho para cuidar, ou, pelo menos, ajudar a outro a apascentar.
Muitos ainda trocaram o púlpito pelo plenário, ou pelo palanque, ou pelo palco.
Virou moda cantores serem ‘ungidos’ a pastores, para dar mais peso ao seu
‘ministério’.
Se der pra ter Abisague, e de quebra, ocupar o
trono, melhor ainda. Mas se não der pra ter um, vale a pena lutar para ter o
outro. E o pior é que Bate-Seba caiu na historinha de Adonias. Prestou-se ao
papel de interceder para que Salomão liberasse Abisague de seu harém, e a
concedesse a Adonias.
Se Salomão se mostrasse fraco naquele instante,
ele correria o risco de por tudo a perder. Por isso, não deixou por menos.
Ordenou que se aplicasse a Adonias a pena que ele merecia desde que usurpara o
trono de seu pai.
Quais são as verdadeiras motivações do nosso
coração?
Por que desejamos ocupar uma determinada posição?
O que nos leva a
gastar cinco anos de nossas vidas numa faculdade?
Seria o conhecimento lá
adquirido, ou simplesmente o canudo que receberemos na conclusão do curso?
Por
que um pastor luta para encher sua igreja?
Seria pela satisfação de ver almas
salvas, ou pelo prestígio que isso lhe garantiria?
Enfim, as lições apreendidas
neste episódio da vida de Davi, podem e devem ser aplicadas em quaisquer
circunstâncias, e não apenas no âmbito ministerial.
Lembre-se que o coração humano é enganoso. Não
confie em sua capacidade de auto examinar-se. Faça como Davi. Peça que o Senhor
sonde seu coração, e perscrute os porões de sua alma, para ver se há algum
caminho mal. Também não se deixe enganar pela aparência. Quem deseja ocupar o
trono pode estar de olho é em Abisague.
Que Deus te abençoe, te guarde e te de a paz!!!